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sábado, 30 de junho de 2012

Pastejo Rotacionado - Capitulo 4

A produção de grãos e especialmente a produção de cana, têm mudado muito rapidamente o perfil da pecuária Brasileira, que se caracterizava pela imensidão das pastagens e pela baixíssima lotação de animais por hectare. Parecia uma pintura surrealista, um boizinho na vastidão do horizonte. Terras baratas permitiram ao Brasil manter o preço histórico da arroba ao redor dos US$ 20. Mas tudo isto mudou quase da noite para o dia, com o crescimento dos Brics, em especial da China, pela entrada do capital especulativo no mercado de commodities agrícolas e pela idéia duvidosa dos tais combustíveis renováveis, em especial a cana no Brasil, que está empurrando a pecuária para as terras  de relevo mais sinuoso ou degradadas. Na carona, veio, com um século de atraso, o confinamento de bovinos.


Antigamente, a norma era se criar por alqueire (4,8 hectares), uns 5 boizinhos ou umas 4 vaquinhas de leite. A produtividade de leite por hectare era de míseros 1000 litros/ano e a de carcaça de 270 kg/ano e isto nas fazendas mais eficientes. Na realidade, a média nacional é de 4 arrobas/hectare/ano, mas isto nem é bom comentar, pode dar azar e estragar nossa imagem lá fora. Até meados do século passado levava-se até 8 anos para um animal chegar ao ponto de abate. Pelo menos o pobre ruminante, quando ia para o abatedouro, já tinha assistido a 2 copas do mundo de futebol. Depois a média caiu para 30 meses e agora já se trabalha com menos de 2 anos um animal atingir 18 arrobas.

Fazendas produtivas, precisam produzir pelo menos 30 mil litros de leite por hectare/ano ou 1000 Kb de carcaça/hectare/ano. Existem 2 formas de se conseguir isto. A primeira é através do confinamento e a segunda é via o manejo adequado das pastagens e semi-confinamento na estação seca. No caso do leite, o confinamento na seca é necessário a não ser que se utilize da irrigação de pastagens.

O pastejo rotacionado é uma técnica muito eficiente que consiste em colocar a lotação máxima de animais por 1 dia apenas em um determinado piquete. Os animais somente irão retornar àquele piquete de 25 a 30 dias depois, permitindo o descanso e a plena recuperação da pastagem. Ela possibilita trabalharmos com 10 até 30 animais por hectare, na época das águas. Na Fazenda Veredas, a lotação média é de 13 animais por hectare durante os 6 meses de chuva. 

E por que por 1 dia e não por 2 dias ou mais, pois um pasto somente começa a brotar depois de 4 dias após o pastejo? Vou dar 3 respostas que observamos na prática:

1 - Mais de um dia de pastejo temos a formação das trilhas, que reduzem a área produtiva do piquete;
2 - Ocorrerá o pisoteio inútil pelo gado em área já pastejadas;
3 - Um piquete com área equivalente a cinco piquetes de um dia, dificilmente permitirá o pastejo por cinco dias, pois vacas de leite são manhosas e seletivas. Odeiam áreas já pisoteadas em excesso.

Alguns países já usam o pastejo rotacionado por horas, mas isto é coisa de doido varrido, pois numa época em que ninguém mais quer trabalhar no campo, técnicas como esta que exigem mão de obra intensa devem ser esquecidas. Claro, existem até sistemas automáticos mas se você tem alguma sensatez não dê atenção a algum lunático que venha falar em piquetes com porteiras automáticas. Use colar de alho e água benta se necessário, para espantar o infeliz.

Cada Fazenda possui sua própria realidade. Na Fazenda Veredas trabalhamos com 6 conjuntos de piquetes independentes e com corredores individuais. Na verdade o sistema ficou tão complexo que eu já estava vendo a hora que teria que instalar semáforos para regularizar o transito dos animais.

Na pista de alimentação, os animais em lactação são divididos em 4 lotes, cada qual recebendo a alimentação de acordo com sua produção. Cada 1 destes lotes tem a sua disposição em torno de 40 piquetes, nos quais passarão toda a estação das águas de 5 a 6 meses. Pastejam 1 piquete por dia, e têm 10 piquetes de reserva para os meses de veranico e para o final das águas quando os pastos já não respondem satisfatoriamente à adubação química.
Temos ainda:
- um conjunto de piquetes para vacas e novilhas
- um conjunto para novilhotas de 6 a 12 meses
- um conjunto para novilhotas de 2 a 6 meses
- um conjunto para o gado de corte.

 Piquetes Gado de Leite Fazenda Veredas

As vacas em lactação comem em média de 30 m2 de capim/dia. A área que você irá utilizar por piquete é o numero de vacas multiplicado pelo o consumo/vaca/dia. Se cada lote tem 30 animais, você deverá fazer os piquetes de 900 m2.


Se você pensa que suas novilhas vão comer a metade disto, está muito enganado. Uma vaca recebe grande parte de sua alimentação via concentrado, ao passo que uma novilha ou vaca seca deverá extrair do pasto toda matéria seca que ela necessita por dia, o que é em torno de 2,5 a 3% do seu peso vivo. Assim uma vaca ou novilha de 400 Kg pode consumir até 12 kg de matéria seca ou 48 kg de capim/dia. Logo, para o gado que não recebe concentrado é melhor trabalhar com 50 a 60 m2 de consumo capim/dia. Mas tudo isto também depende do tipo de capim que você está usando, mas esta é outra história e sera discutida noutro capítulo.

No caso da Fazenda Veredas, utilizamos dois tipos de capim, o Braquiara Brizanta (Braquiarão) e o Tifton. Resistimos muito em introduzir novas variedades mais produtivas e menos tolerantes como o Mombaça e o Tanzânia, pois o mercado do leite ou carne é muito instável, e tudo deve ser feito passo a passo.

O Braquiarão tem algumas virtudes, como sua resistência, boa tolerância as terras com baixo PH, que é o caso do nosso cerrado, uma tolerância razoável a cigarrinha e boa produção de forragem. 

Mas o uso de pastejo rotacionado na minha opinião não seria viável, sem os adubos protegidos que possuem uma película composta de um polímero especial que só se dissolve em contato com a água, protegendo assim os componentes mais voláteis, como a ureia. E mais, este polímero se liga ao alumínio presente em nossas terras permitindo uma melhor absorção do adubo. Assim, mesmo sob sol escaldante pode-se jogar o adubo na terra, que ele não vai evaporar. Isto permite aplicar a regra básica do pastejo rotacionado. Adubações diárias assim que o gado deixar o piquete.

E o mais importante: adubação orgânica (esterco do curral e área de confinamento) é fundamental. Um dos bens mais valiosos que uma fazenda pode produzir.

Na figura ao lado exemplos de 4 módulos de piquetes plotados no google earth. Temos piquetes menores para o gado de leite, à direita, e piquetes maiores para vacas secas, novilhas ou gado de corte.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Criando as Bezerras - Capitulo 3

Bezerreiro Fazenda Veredas (Modelo Argentino)
Para uma vaca liberar o leite durante o processo de ordenha é necessário uma série de estímulos, para que ela produza um hormônio chamado oxitocina que irá desencandear o processo pelo qual podemos coletar o leite. 

Vacas com graus de sangue de 3/4 Holandês para baixo, normalmente necessitam do estimulo do bezerro para liberar a oxitocina e consequentemente o leite.

É por isto que antigamente se tirava leite de uma vaca com o bezerro amarrado ao lado da vaca, isto no tempo das ordenhas manuais. Mas bezerros e ordenhas mecânicas são incompatíveis,  pois acabam por atrasar o serviço, gastar mais energia elétrica e provocar choro e ranger de dentes entre os ordenhadores visto que bezerros não são muito inteligentes.

Um rebanho igual ou superior a 7/8 de grau de sangue  holandês, pode-se ordenhar perfeitamente sem o bezerro, pois a vaca, neste caso, desce o leite simplesmente com o estimulo das massagens no ubere pelo ordenhador e pelo próprio ambiente e sons da ordenha.  

Os produtores que não tem ainda um rebanho uniforme 7/8 ou superior, mesmo assim fazem a desmama precoce do bezerro, e usam oxitocina sintética aplicada na veia com seringas de 1 ml, para estimular as vacas a descerem o leite. não é o ideal, e provoca efeitos colaterais discutíveis e não exatamente identificados ainda. Mas já vi relatos de ovários policísticos e infertilidade precoce. Mas nunca encontrei nada definitivo sobre o assunto.

Mas então o que fazer com o bezerro, pois eles precisam ingerir leite por pelo menos por 2 meses até estarem aptos a sobreviverem de  volumoso (capim, silagem ou feno) e concentrado.

Só existe uma maneira eficaz, colocá-lo num bezerreiro onde ele ficará amarrado a uma corda, com um pouco espaço de locomoção e sem contato físico com os demais e recebendo claro, leite 2 vezes ao dia mais concentrado.

Muitos produtores preferem criar os bezerros livres, como na natureza, em pequenos pastos, e recebendo leite 2 vezes ao dia. Esta é a maneira mais eficiente de levá-los desta vida para outra melhor se é que bezerros têm outra vida. Bezerros brincam muito, têm muito contado físico e pior, mamam uns no outros. O que leva a disseminação de doenças e futuras vacas com peitos perdidos.

Na Fazenda Veredas tínhamos um índice de perda de bezerros muito grande, quando usávamos este método natural e assassino. 

E lutávamos para atingir o índice normal de perdas recomendado pelo pessoal especializado que é de 2% a 3%.

Passei então a estudar os diversos modelitos de casinhas de bezerros sem nunca entender o por quê de se usar casinha de bezerros pois eu não imagino uma vaca livre na natureza ( se é que isso existe) construindo uma casinha para seu bezerro.

Até que me deparei com o método simples de nossos hermanos argentinos. E lembrando de Alvin Toffler: “A tecnologia não precisa ser grande, cara nem complexa para ser sofisticada.”

O fundamental para um bezerro é a sombra,  e a maneira mais eficiente de se proporcionar isto é com um sombrite. Testamos sombrites com proteção da luz do sol de 50% a 85%. Percebemos que o de proteção 50% proporciona um coforto térmico bom para os animais e por ser mais leve dura muito mais e causa menos problemas de manutenção alem de ser muito mais barato.

Os sombrites são sempre colocado no sentido norte-sul, a uma altura de 1,80 do solo,  de tal modo que a luz do sol incida sobre toda a área em que o bezerro caminha ao longo do dia, ajudando a secar e a esterilizar a área.

Como a sombra se desloca no sentido oeste para leste , os bezerros vão mudando instintivamente de posição ao longo do dia.

Arames de 3 metros são disposto no sentido leste a oeste, rente ao solo, numa distancia de 3,5 metros um do outro, para o deslocamento dos bezerros que são presos nele, um em cada arame,  por uma corda e um gancho giratório de metal, chamado de mosquetão.

A distância de 3,5 m de um arame ao outro é para que os bezerros não se toquem, evitando assim a transmissão de doenças.

Os arames são presos em cada ponta em postes de eucaliptos de 5 a 7 cm de diâmetro, e neste postes pendurados um vasilhame com água e outro com ração a partir do quinto dia. A água deve ser trocada diariamente e os vasilhames lavados semanalmente, no mínimo.

Nas épocas mais críticas da estação das chuvas, é necessário dar banho de iodo a 2% nos bezerros com uma bomba costal, para que eles não sejam atacados por fungos oportunistas.

Utilizando este método, ficamos 3 anos sem perder uma bezerra sequer, mesmo trocando funcionários.


Ao lado podemos ver uma série de modelitos fantasiosos para bezerreiros. São caros, e como a luz do sol não incide diretamente sob o abrigo necessitam ser mudados periodicamente de lugar, o que se deixados por conta dos funcionário dificilmente ocorrerá.  Os americanos como podem ver levam tudo ao extremo e tem modelos que são verdadeiros campos de concentração para os bichinhos. 



segunda-feira, 25 de junho de 2012

Escolhendo o Rebanho - Capítulo 2

Para o produtor iniciante, para se produzir leite é necessário primeiramente uma vaca e ele imagina que uma vaca é uma vaca e que todas dão leite, o que pode estar tecnicamente correto mas na verdade existem vacas de corte que dão leite apenas para garantir a sobrevivência e o bom desenvolvimento do bezerro e vacas de leite, que foram ao longo de gerações selecionadas pelo homem para que produzam  mais e mais leite. E o que se tem hoje são verdadeiras anomalias da natureza, vacas podendo produzir  80 ou mais litros de leite por dia. É muito comum vacas com  40 litros/dia em qualquer fazenda um pouquinho mais tecnificadas no negócio do leite.

Existem basicamente 2 raças de bovinos: Bos taurus taurusgado europeu, e o Bos taurus indicus, ou gado zebuindiano. Ambas raças sofreram intervenções para se especializarem na produção de carne ou de leite. Um exemplo: o Nelore uma espécie da  raça Zebu, foi trabalhado sempre no sentido de se ter a melhor produção de carcaça, de tal forma que o homem exagerou, pois a cada geração ela se tornou pior na produção de leite, sendo necessário dar um passo para trás,  pois as mães já não conseguiam dar o leite necessário para um bom desenvolvimento dos bezerros. Na outra linha temos o gado holandês, imbatível na produção de leite. 

No Brasil, as raças mais utilizadas na produção de leite, são a Holandesa e o Gir Leiteiro, que cruzadas entre si, geraram uma raça Brasileira chamada Girolando, que une a rusticidade do Gir com a produtividade do holandês. Quanto mais voltado para o Holandês, menos rusticidade e maior produção de leite e maior longevidade na lactação. Quanto mais voltado para o Gir, mais rusticidade, menor produtividade e lactações mais curtas.

O gado Gir e o Girolando com grau de sangue de no máximo de 50%, são  adequados para a produção de leite exclusivamente a pasto, o chamado leite verde. Já o Holandês e o Girolando com grau de sangue Holandês acima de 50% são indicados para sistemas mistos, com pastoreio na estação das águas e  confinamento na seca.

Produtores iniciantes que não dispõem de infra-estrutura para confinamento, cometem um erro muito comum, ao escolherem vacas mais voltadas para o holandês, esquecendo-se que na seca, sem alimentação adequada, elas vão definhar reduzindo drasticamente a produção de leite. E se nada for feito, provavelmente irão morrer de inanição.

Produtores mais precavidos, escolhem o tradicional 1/2 sangue ou mesmo vacas Gir. Outros, compram vacas baratas, o chamado tatu com cobra. Vacas mistas, frutos de cruzamentos de vacas neloradas com bois nelorados e que resultam num animal com sangue Gir, Nelore, e Holandês, o chamado triclós ou F2, mas esta é outra história. Normalmente, estas vacas amarra-cachorro produzem lactações com menos de 1500 litros em 300 dias ou média de 5 l/dia, enquanto que uma holandesa bem nutrida pode dar lactações de até 16 mil litros em 300 dias ou média de 50 l/dia.

Existe uma outra raça com um certo appeal entre os produtores, a Jersey, que são vaquinhas pequenas, que comem pouco e produzem relativamente muito leite e com alto teor de gordura e proteína, gerando preços melhores aos produtores, pois quanto maior a gordura e proteína maior a bonificação por litro de leite.

É muito comum o cruzamento do Jersey com o Holandês, gerando o  Jersolando. O produtor brasileiro tem um certo desejo incontido pelos cruzamentos entre raças, o que melhora algumas características e piora muitas outras. Mas verdade seja dita, a raça Girolanda é um sucesso, principalmente o 7/8, que é dócil e dá leite sem bezerros em longas lactações. E também o 1/2 sangue, com ótima aptidão para produzir leite a pasto, boa produção de leite e de coices no ordenhador.

Produzindo Leite: Introdução - Capitulo 1

Produzir leite é muito fácil e muitas pessoas são seduzidas pela rapidez com que se pode iniciar a produção e principalmente pela receita mensal que se pode alcançar quase que de imediato. E mais, não existe a preocupação nem os custos de se  vender o produto, algo que se torna a razão de sucesso ou fracasso da maioria dos demais negócios neste mundo.  Tudo que você consegue produzir as empresas compram e pagam religiosamente e mais, quanto mais você produzir melhor a remuneração por litro de leite que você recebe. Tudo parece maravilhoso e ao lado do petróleo e das drogas ilícitas, o leite parece ser um negócio fabuloso. O verdadeiro ouro branco.

Mas como diz o velho ditado, quem não nasceu para o ofício não se estabelece, o negócio do leite é uma armadilha irresistível, que leva muitos amadores bem intencionados a mergulharem no abismo. O fracasso ronda permanentemente o negócio, pois os preços são voláteis, manipulados pelos Laticínios ao seu bel prazer seguindo uma lógica desprovida de qualquer coerência de tal forma que ao longo de uma década o preço médio por litro pouco varia enquanto os demais insumos necessários para se produzir o falso ouro branco, tem aumentos de preços da ordem de 200% a 300%. 

Mas, tudo isto será discutido detalhadamente nesta série que pretende levar ao àqueles que pretendem se enveredar neste negócio caminhos a serem trilhados e muitos outros a serem evitados.